Fatinha

Definições

In humor on 11/04/2024 at 1:56 PM

Querido Brógui,

Uma das Coroas de Cristo que ornam os pitocos da calçada foi abduzida na calada da noite. Alienígenas? Eu quero acreditar. Mas não acredito. O acontecido não chegou a ser uma surpresa, visto que, desde que fiz o plantio, essa mudinha não ficou muito firme, tadinha. Não deve ter sido tão difícil subtraí-la.

Espero, com todas as forças da minha maldade, que o autor do fato tenha perdido muito sangue nos espinhos da plantinha. Espero também, com todas as forças da minha bondade, que ela seja bem cuidada , cresça e dê muitas flores.

Quando vi a cena do crime, suspirei e, tranquilamente, fui pegar minhas luvas, minha pazinha e a outra muda – que eu, espertamente havia deixado como possível suplente. Nesse ínterim, imergi em minhas reflexões metafóricas.

O que essa minha atitude de plantar mudinhas na calçada, mesmo sendo advertida por milhões de pessoas acerca da possiblidade-quase-certeza de que elas corriam o risco de serem furtadas, diz sobre minha pessoa?

Insistir em fazer o plantio, não obstante os olhares consternados do tipo “tadinha, inocente”. Seria teimosia, cabeça-durice, obstinação, firmeza, resiliência ou puramente uma burrice siderúrgica (como diria João Saldanha)? Dedicada ao tal do “conhece-te a ti mesmo” socrático, antes de escrever esse post, pesquisei arduamente sobre o assunto.

Essa imagem aí me cativou. Às vezes empaco mesmo. Entretanto, desde que que a teima não se transforme em idiotice patológica, como acontece com aqueles que não dão o braço a torcer ainda que a realidade caia como um bloco de concreto na sua cabeça, até que a teimosia é uma boa arma para a sobrevivência – ou para as conquistas. É uma característica não de todo negativa, pois é pertinente a quem não desiste facilmente.

Sobre obstinação, encontrei essa frase, atribuída ao genial Chaplin. Se foi ele mesmo quem disse isso, não tive saco de investigar, mas isso depois você faz. Google tá aí pra isso. Se Chaplin foi obstinado, então deve ser legal ser assim: persistente, insistente, ter convicção.

Quanto a ser cabeça-dura, não encontrei referências muito elogiosas sobre. Primeiro porque a cabeça-durice é associada à dificuldade de compreensão ou de aprendizagem o que, no mais das vezes, não é o meu caso. Reconheço que apanho para entender aqueles desenhos que ensinam passo a passo a montagem de um objeto. Também não sei exatamente como abstrair a física quântica – embora já tenha lido sobre o assunto. Apesar, disso, recuso-me a me auto encaixotar nessa categoria, na qual me parece que a pessoa se agarra a uma verdade particular e, como diria Mamãe, acaba por se tornar o único soldado com o passo certo no batalhão.

Cheguei então à resiliência, que me parece um termo chique para nomear aquele que enverga mas não quebra, aquele sobrevivente porque é adaptável às mudanças. É um ser resistente, maleável, flexível, que supera as adversidades. Na Física, é a propriedade que alguns corpos possuem para retornar à sua forma original depois de deformados. É. Bacana essa parada de resiliência.

Pois é. Exercitarei meu seja-lá-qual-for-o-adjetivo e replantarei as Coroas de Cristo, enquanto isso não me incomodar. Quando isso acontecer e eu me emputecer, meto um Cacto Bola, também conhecido como Cadeira de Sogra e aí eu quero ver neguinho meter a mão.

Relendo-me, reescrevendo-me, redivertindo-me

In humor on 10/04/2024 at 10:22 PM

Querido Brógui

Não falta inspiração, nem disposição. Apenas resolvi ler o conteúdo do Querido Brógui, só pra conferir se eu era tão engraçadinha como sou agora. Sou. Dei uma burilada no vocabulário, liberei os palavrões e não cito mais os nomes nos textos.

Decidi que seria bacana republicar, devidamente editados e melhorados, posts antigos. Aliás, foi phodda me auto editar a mim mesma. Acho que além de me reler, eu me reescrevi.

Acho que os Bróguis que me acompanhar desde sempre vão se redivertir – adoro criar neologismos – e os recém convertidos vão saber que essa nobre pessoa que aqui escreve sempre foi meio mais ou menos capaz de rir até de fratura exposta.

Então, segue aí uma pérola, escrita depois de um almoço com uma amiga – que é minha irmã até hoje. Há quem se orgulhe de acumular dinheiro. Eu me orgulho de acumular amigos, que continuam a ser meus amigos, apesar de me conhecerem muito bem.

Há muito tempo que não dou tantas gargalhadas como ontem, na hora do almoço. Sabe aquelas minhas gargalhadas altas, padrão “comunidade”?

Fui comer sushi em um restaurante era rodízio. Na boa? Rodízio é para os fortes e que tem estômago dilatado. Sou fraca e como muito pouco. Então, como aprendi, rodízio não dá pra mim.

No breve lapso de tempo em que fui ao banheiro, Bobinha começou a fazer o pedido. Acho que estava com muito apetite – maneira gentil de dizer que devia estar roxa de fome – pois mandou ver. Beleza.

Quando começou a chegar a comida, vi que era o suficiente para alimentar uma dúzia de estivadores (se é que um estivador comeria peixe cru). Arregalei os olhos e disse que a gente não ia conseguir dar conta daquilo tudo. Perguntei se tinha alguma multa, algum castigo físico se a gente deixasse comida no prato. Bobinha garantiu que não. E eu acreditei.

Iniciamos os trabalhos. Comemos, comemos, comemos… A quantidade de comida era infinita. Lá pelas tantas, começou a sair sashimi pelas nossas orelhas. Ainda restavam mais de trinta peças para serem comidas, fora os espetinhos, o nirá, o rolinho-primavera e outros acepipes.

Minha Brógui olho-grande-maior-que-a-barriga então, muito sem-graça, me comunicou que teríamos que pagar pelas sobras. Comecei a rir. Desespero? Não. É muito engraçado mesmo a gente ser obrigada a comer – principalmente depois que ultrapassamos a infância. Mais engraçado ainda é ir a um restaurante e pagar pelo que comeu e pelo que não comeu. ok. É pra evitar o desperdício e coisa e tal, mas não deixa de ser bizarro.

O efeito desse comunicado foi desastroso. Além de eu começar a rir compulsivamente, o que dificulta um pouco a ingestão de qualquer alimento, meu estômago já lotado até a boca ficou com câimbras. Somado a isto, a impressão que tive foi que a comida crescia na boca e se multiplicava no prato.

Fui até a área externa dar uma caminhada pra ver se a comida se acomodava pra caber mais. Tipo motorista de ônibus que dá aquela freada pra entrar mais gente.

Quando voltei, ainda com a última peça de sushi entalada no esôfago, sugeri que começássemos naquele instante a praticar a bulimia. Sabe? Abrir espaço para comer mais. Minha sugestão não foi acolhida. Respirei fundo, comi mais uma ou duas peças e comecei a rir de novo. Dessa vez foi de nervoso mesmo.

Então, reparei que um milagre estava acontecendo diante dos meus olhos. Nenhuma de nós comia, mas as travessas estavam ficando mais vazias. Olhei para Bobinha e ela, vermelha, desviou o olhar. Bróguis! Ela tava tacando a comida dentro da bolsa! Numa versão tupiniquim dos maiores ilusionistas de las Vegas. A comida ia desaparecendo numa velocidade inacreditável. Num piscar de olhos a abdução acontecia. No maior espírito colaborativo, entrei no esquema e ia sutilmente posicionando os pratos cheios perto dela, para facilitar as manobras. Peguei mais guardanapos na mesa vizinha para ela embrulhar a comida.

Nesse ponto, ela foi contagiada pela minha crise histérica de riso. A gente dava gargalhadas enquanto a comida era sugada pela bolsa dela. Comecei a ter ideias diabólicas como fazer paredinha pro garçom não ver ou roubar logo os pratos pra acabar com o nosso sofrimento. Também lembrei que ela ia ter que pegar a carteira dentro da bolsa e os sashimis iam pular lá de dentro e nos denunciar.

Lá pelas tantas, o gerente se aproximou e disse que não precisaríamos pagar pelas sobras. Sei lá por que. Talvez nosso comportamento estranho tenha chamado sua atenção, ou ele queria que desocupássemos a mesa, ou ficou com vergonha por causa dos outros clientes. Não importa. Nos safamos dessa com a dignidade mais ou menos intacta.

Saldo do almoço: a bolsa da Roberta fedia a peixe, meu carro ficou fedendo também e estávamos felizes.

Dia Perfeito

In humor on 07/04/2024 at 10:10 PM

Querido Brógui,

Meu dia perfeito não é um dia digno de Facebook ou Instagram ou Ticktok (é assim que escreve?), ou de pseudo-celebridades. Tampouco é um dia de influencers que, em sua maioria, não passam de cabeças de abóbora querendo fazer uma graninha cagando regras, dando opiniões estapafúrdias e fazendo dancinhas.

Meu dia perfeito pode ser um dia ocupado ou de bobeira total. Pode ser sozinha ou acompanhada. Pode ser fazendo serviço de corno ou vendo um filme. Não tem regra pra ficar feliz.

Essa semana que passou, tive quatro dias perfeitos. QUATRO!!!! Pense!

O primeiro dia foi compartilhado com duas amigas daquelas que não vendo, não dou, não boto no prego. Posso emprestar, mas meto porrada se não forem devolvidas. Essas meninas se despencaram (sim, moram longe e não têm carro) até Vila Isabel pra me ajudar numa tarefa chatinha. Chatinha, não. Chata pra caraio. Começar a selecionar itens da casinha (estou “espalhando” algumas coisas, um termo muito mais bacana do que “desfazendo”). Aquela casa é uma mistura de brechó com antiquário com uma pitada de neurose acumuladora.

Passamos o dia entre empacotar livros, louças, comer poeira, jogar papel fora, tomar cerveja, coca-cola e comer galeto. Rimos, trocamos confidências, discutimos qual a melhor forma de organizar uma caixa, negociamos quem ia levar que móvel pra casa.

Toneladas de livros. Todos os que um dia moraram naquela casa, vieram com a informação no DNA de leitores compulsivos. Em todos os cantos da casa, há uma estante transbordando. As louças delicadas, fofas, que foram de Mamãe, devidamente lavadas e carinhosamente embaladas. Eu fiquei com a parte de futucar as dezenas de pastas nas quais Papai arquivava contas, recibos, extratos de banco, declarações de Imposto de Renda (papelada com mais de trinta anos!). Achei umas pérolas, como o documento da maternidade no qual foi registrado o meu nascimento e o de Bão (” feto aparentemente normal”, tinha escrito. gente! aparentemente!). Uma foto do Papai com cinco meses e dedicatória para o avô dele. Documento de alistamento militar. Céus! E essa é somente a ponta do iceberg.

O segundo dia perfeito foi a visita do Irmão. Veio rapidinho, mas foi o suficiente para aquecer meu coração. Almoçamos juntos. Tomamos sorvete. Começamos a assistir uma série na televisão (não conseguimos ver toda a temporada, eu vi depois sozinha. acho que vou contar aqui o final só de maldade). Apresentei o CADEG ao carioca que nunca havia ido lá, compramos plantinhas, comemos bolinhos de bacalhau. Isso tudo e ele ainda participou de duas reuniões on line. Impressionante como o tempo rendeu.

O terceiro dia foi o dia da ressaca do show que fui na sexta, lá no Circo. Acordei tarde, voltei a dormir, acordei de novo, voltei a dormir. Nem sei se fez sol. Não botei o nariz pra fora do quarto.

E hoje, foi o quarto dia sensacional. Acordei cedinho e fui plantar minhas Coroas de Cristo nos pitocos da calçada. Hein? Eu explico. Mandei consertar a calçada arruinada pelos caminhões que abastecem o depósito de material de construção que fica quase em frente de casa. Obviamente, não gastei meu rico dinheirinho naquela loja. Seria muita esquizofrenia eu comprar cimento do fulano responsável pelo dano. Mas pretendo ir lá jogar na cara dele o prejuízo e perguntar se ele não vai contribuir com algum pichulé.

Pra evitar que os caminhões destruam tudo de novo, coloquei uns pitocos, que vêm a ser uns canos cheios de concreto que plantei junto ao meio-fio. Achei que ia ficar feio aqueles trecos pintados de amarelo e então decidi comprar umas flores. Uma pra cada pitoco. Coroa de Cristo é aquela gracinha que dá flores miúdas, de várias cores e é CHEIA DE ESPINHOS. É, Brógui, a gente tem que pensar nos vãndalos e nos sem-noção que furtam as mudinhas alheias. Também tem que ser uma plantinha guerreira, pra aguentar o sol no quengo o dia inteiro. Fica a ideia: fazer dos pitocos dublês de vasos.

Depois de cumprida essa meta, fiquei na paz, lagarteando na piscina, atracada com meu livro. Até cochilei.

É isso. Bora tentar fazer nossa semana ter dias perfeitos?