Fatinha

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Rotina

In humor on 28/11/2017 at 6:53 PM

Querido Brógui,

Segue a rotina. Ok, todo mundo a tem. Uns tem rotinas mais animadas, menos… digamos… fora do rotina. Outros tem a rotina rotineira mesmo. Tipo eu.

Basicamente, não há na minha rotina um dia em que eu não tenha um sem-número de coisinhas pra fazer. Coisinhas miúdas, coisinhas não tão miúdas assim.

Sete horas da manhã. Toca uma rumba no meu celular. É o toque do despertador. Acordo. Digo, levanto. Acordar já é um processo mais lento. Só depois da canequinha de café e do banho canja (sabe? com a água bem quente, quase arrancando o couro, que deixa a pele formigando?).

Sigo pra cozinha. Fervo água. Coloco na canequinha. Um minuto para a canequinha esquentar, devolvo a água pra chaleira, coloco a água no filtro, passo o café (ops! esqueci de botar o pó). Sigo para o banheiro (com a canequinha, óbvio). Saio do banho, sento em atitude contemplativa em frente ao armário. Com que roupa eu vou? Escolho uma peça pra montar o restante. Geralmente começo pelo sapato, mas às vezes dou uma variada. Separo o look do dia enquanto penso a que horas vou conseguir voltar para a cama. Passo o hidratante, o perfume, o desodorante.

Volto para a cozinha. Pozinho para o joelho (remédio que provavelmente custa mais caro do que eu apuraria vendendo meu joelho no mercado negro) no copo com água. Pego as vitaminas que minha médica prometeu que iriam me dar mais disposição, mais energia e aumentar a minha libido (ela disse, quase chorando de rir, que com a vida que eu levo é querer muito ainda ter libido). Volto pro quarto enquanto o pozinho dissolve. Visto a roupitcha (não ficou boa. troco a roupitcha. melhorou, mas não tá legal. troco de novo. pronto. agora fiquei lindona).

Volto para a cozinha. Pozinho do joelho pra dentro, outro pozinho no copo. Este é o que chamo de pozinho da fé. Colágeno. Promete manter as pelancas sob controle, fortalecer unhas e cabelos. Tenho fé. Tomo todos os dias enquanto acompanho as rugas se formarem ao redor dos olhos, a bunda desmoronar e o músculo do tchau cada vez mais me forçar a apenas sacudir os dedinhos quando me despeço de alguém. Meu raciocínio é: “se com colágeno despenca tudo, imagine sem ele?”.

Hora do reboco. Vou para o banheiro. Momento argamassa no qual tento (nem sempre com sucesso) disfarçar as imperfeições sob camadas e camadas de maquiagem. Começando pelas olheiras, que, dependendo do dia, ou melhor, da noite que passei pode estar escura, muito escura ou profundamente escura. Um tanto de corretivo, um tanto de base, pó, sombra, lápis, máscara para os cílios, batom e pronto. Agora posso me apresentar a outro ser humano sem causar traumas irreversíveis.

Volto para a cozinha. Pozinho da fé pra dentro. Mais uma canequinha de café. Volto para o quarto, arrumo a bolsa (cadê aquele batom? sim. a pessoa tem pra lá de trinta batons, variando do nude ao vermelho-capeta, mas quer exatamente o que não sabe onde está. provavelmente perdido no fundo de alguma outra bolsa. que também não sabe onde está). Enquanto arrumo a bolsa, dou uma olhadinha no WhatsApp pra ver quem foi o filhodaputa que mandou mensagem pra mim às três horas da madruga. Aproveito pra checar  o e-mail, a conta bancária, separar algum documento que tenho que levar, responder a um ou outro bom dia, ver a fatura do cartão de crédito (corto os pulsos ou tomo cicuta?). Repasso mentalmente todos os telefonemas que eu tenho que dar, todas as picas que tenho que encarar, todos os abacaxis que tenho que descascar. Coloco a roupinha da academia na mochila (como disse, sou uma mulher de fé. quem sabe hoje consigo dar um pulinho lá?).

Pego a chave do carro e aí surgem as variações na rotina: posso ir direto para o trabalho ou ir levar Mamãe à fisioterapia ou ir ao médico ou pegar o resultado de um exame no laboratório ou ir ao banco ou passar no posto pra abastecer e calibrar os pneus ou qualquer outra faina glamourosa nesta mesma diapasão.

Cansou não é, meu Broguinho querido? E ainda nem saí de casa…

Programa cachorro é legal

In humor on 01/08/2017 at 3:54 PM

Querido Brógui,

Programa cachorro pode ser um programa legal. Ou um programa legal pode se tornar um programa cachorro. Depende da sua disponibilidade, depende de com quem anda.

Sabe quando um programa todo planejado não sai como todo planejado? Você pode escolher entre cortar os pulsos ou se divertir. Simples assim. Imagine: você colocou aquela sandália ma-ra-vi-lho-sa, mas que morde seu pé. Pensou, bobinha, que ia ficar tranquilamente sentada a noite toda, fazendo pose. Então, o cidadão a convida, todo animado, para uma caminhada na orla. E aí? Vai dar um soco nele? Claro que não. Você sorri o seu melhor sorriso, oferece seu sacrifício pela paz no mundo e vai. Dá a mão pra ele, foca na conversa, na paisagem, no quem sabe beijo na boca. Abstrai o fato de que amanhã a sola do seu pé vai estar em carne viva. Esquece que aquele vestido vai ficar arruinado porque sentou num banco podre de sujo na beira da praia. No final, tudo correrá bem e você ainda descobrirá que o bofe é um cavalheiro e que não permitirá que você se esborrache nas malditas pedrinhas portuguesas.

Já se despencou pro fim do mundo pra ir a uma festa junina e chegou lá não tinha festa junina alguma? Fazer o quê? Emburrar? Esmurrar? Nada disso. A solução é rir do desavisado que lhe meteu nesta roubada. Rir junto com o desavisado. Mude de planos. Sente para jantar naquele restaurante que ele jura que é ótimo. A comida é uma merda? Ria da péssima escolha, fale mal do restaurante, do cozinheiro, da mãe do cozinheiro, dos transeuntes, da música insuportável muitos decibéis acima dos aceitáveis por um ouvido humano, da grana jogada fora. Tope matar a fome comendo um salsichão. Pare em todas as bibocas possíveis e impossíveis e, a cada parada, curta o prazer de descobrir que não há salsichão em lugar algum daquele fim de mundo. Acabe sua noite rindo muito, comendo um sanduíche no MC Donalds que você odeia e agradecendo a Deus porque até no fim do mundo existe um.

Bom, também tem o programa legal que vira programa cachorro e que vira programa legal de novo. Que tal findar uma noite romântica passando mal porque comeu como uma refugiada? Caiu dentro de uma churrascaria como se nunca tivesse visto carne na vida? Comeu uma pururuca sentindo suas artérias entupirem a cada mordida e ao final, sua barriga sarada ficou qual a de uma gestante? Deu refluxo? Tudo bem, ria do fato de sua noite romântica findar com ele dando suaves tapinhas nas suas costas como se você fosse um bebê entalado ou recostada porque se deitar vai morrer sufocada. Solte boas gargalhadas que só farão seu mal estar aumentar e registre a história pra rir de novo várias vezes, só de lembrar do mico.

Conseguiu captar? Percebeu que sentar num banco da pracinha dividindo uma latinha de refrigerante pode ser legal? Fila de banco, mercado? Agora, se a companhia não for legal, já era. Programa cachorro será sempre cachorro assim como programa legal também será sempre cachorro.

 

O passarinho

In humor on 03/06/2017 at 7:22 PM

Querido Brógui,

E lá pelas tantas da manhã, alvoroço em casa: havia entrado voando, pela porta da cozinha, um passarinho. Tadinho… Desorientou, perdeu o rumo e acabou dentro de casa. Onde ele está? Não sei, não vi. Demos uma olhada, e, como não o encontramos, caso encerrado. Deve ter saído pela janela.

Tô ouvindo um pio. É o passarinho. Ele ainda deve estar aqui dentro. Eu não tô ouvindo nada. Nem eu. Mas eu estou. Levantei do sofá, olhei nos cantinhos, ele deve estar encurralado em algum lugar. Nada. Nenhum rastro.

Tão ouvindo? É o passarinho. Tá doida? Eu não tô doida. Falo sozinha, mas ainda não estou ouvindo vozes. Nem pios.

Almoço. E agora? Ouviram? Agora ouvimos. Cadê o bendito passarinho? Procura, procura, procura. Vai ver que estamos ouvindo ele cantar lá fora, pensando que está aqui dentro. É. Deve ser isso.

Quem quer um docinho? Eu! Oxe! Olha quem está aqui! O passarinho! Na prateleira do móvel da sala. Escondidinho. Eu não vou tirar porque tenho medo. Pode deixar que eu tiro. Não precisou. Num rápido e corajoso movimento, saiu o bichinho voando, direto janela afora.

Ficou horas ali, assustado, sem conseguir sair da cilada em que se meteu. Preso sem estar preso. Como muitas vezes ficamos. Como o passarinho de hoje,  ficamos presos, apavorados, sem ver uma saída, quando ela é simples. É só sair voando. É só vencer a paralisia que o medo nos traz.

Claro que o medo é saudável, é necessário, é sobrevivência. Mas se desmesurado, embota, bloqueia o raciocínio, trava tudo, inclusive a visão da saída. Aquela janela que está bem na nossa frente, como estava a janela libertadora do passarinho, não é enxergada, ou fica longe demais, ou difícil demais. Aí, corremos o risco de acabar nos acostumando com aquela prateleira, com o desconforto, o medo torna-se parte de nós. Acabamos por esquecer que um dia quisemos sair voando. Esquecemos de que podemos voar, como é gostoso ser livre, o quanto perdemos por não nos arriscar (mesmo que só um pouquinho, um risquinho calculado que seja).

Olha só, passarinho: você me fez me lembrar de mim. Escapei de uma prateleira há pouco tempo. Olhei para a janela, respirei fundo e me lancei. Com o coração disparado, achando que talvez não fosse conseguir, mas abri minhas asinhas e voei.

PS: Tá, Querido Brógui… Eu sei que a metáfora foi pobre, mas dá um desconto porque há muito não escrevo. Tô meio enferrujada. Não serei como o personagem descrito por Fernando Sabino na obra “O Encontro Marcado”:

” Era um homem de certo talento, que cedo foi apanhado e se mediocrizou. Agora está tentando achar o caminho e não consegue, porque para descobrir o caminho para o talento, é preciso talento.”

Eu não me mediocrizei. Vou descobrir meu caminho de volta.

 

 

um ano

In humor on 01/06/2017 at 1:23 PM

Há um ano Mamãe saiu do hospital e voltou pra casa, após 52 dias de internação. No hospital, vivi com ela. Estava internada com ela.

UTI. De manhã, lá ia eu saber do boletim médico. Quadro estável, sem intercorrências. Visita à tarde. Quadro estável, sem intercorrências.

No dia seguinte, tudo de novo. Ou pior.

Respirando com cateter. Oxigênio. Acesso profundo. Direto na jugular. Não tinha mais como pegar a veia.

No dia seguinte, tudo de novo. Ou pior.

Sonda nasogástrica. Ela não se alimentava mais. Pedi para ir dar comida pra ela. Obtive autorização. Dava o almoço. Saía. Hora da visita, entrava. Saía de novo. Hora do jantar, entrava. Ia pra casa, banho, cama.

No dia seguinte, tudo de novo. Ou pior.

Infecção urinária. Sonda. Rins meia-boca. Pulmão ainda infiltrado. Coração não estava dando conta.

No dia seguinte, tudo de novo. Ou pior.

Atada ao leito. Estava entrando na fase do delírio. Ficava agitada. Trocava o dia pela noite. Também… quem consegue saber, dentro de uma UTI, se é dia ou noite?

No dia seguinte, tudo de novo. Ou pior.

Exames, exames, exames. O que ela tem? Estamos pesquisando. Os rins estão brigando com o coração, que está brigando com o pulmão. Estamos ajustando a medicação.

No dia seguinte, tudo de novo. Ou pior.

Sua mãe arrancou tudo durante a noite e não deixa colocar de novo. Tudo o quê? Tudo. Acesso, sonda, medidor de pressão e frequência cardíaca, cateter. E agora? Deixa sem. Vamos acompanhar. Foi bom. Durante o delírio, ela resolveu tudo. Acelerou o processo da alta. Provou que aquele monte de tubos e fios não eram pra ela.

O que ela tem? Aqui não é lugar pra ela. Os vizinhos dela estão em coma. Ela pode se recuperar no quarto. Estamos pesquisando. Exames, exames, exames. Depois de muita briga, muita Ouvidoria, alta para o quarto. Não tem quarto disponível. Como não tem quarto? Mais uma noite. No dia seguinte, tudo de novo. Briga, briga, pede, pede, não tem quarto.

Agora vai. Tem quarto. No sábado? Negativo. Não vou tirar minha mãe da UTI pra cair na mão de plantonista. Se o Rotina dá defeito, imagine o Fraldinha de plantão?

Agora vai. Quarto.

Eu, no sofazinho maldito, onde ou cabe a cabeça, ou cabe o pé. Noites mal dormidas ou não dormidas. Eu e ela. O sono é interrompido pelos seus delírios, suas conversas, reclamações – abaixa a cama, levanta a cama, me vira, me desvira, tira o cobertor, bota o cobertor, me dá água. O sono é interrompido quando tosse, quando engasga, quando começa a cantar, bate palmas. Mamãe, pelo amor de Deus! Vai dormir! Me deixa dormir!

Às seis da manhã, começa o entra-e-sai do quarto. Medicação. Pressão. Glicose. Café da manhã. Banho. Sinceramente, não sei quem estabelece estas rotinas. Quando o paciente começa a dormir, vem a colação, a medicação, a fisioterapeuta, a nutricionista, a visita médica, o almoço, a higiene, o técnico de enfermagem, o técnico do laboratório. Um agito sem parar.

Quando vai ter alta? O que está faltando? Ela está cada vez pior. O corpo dela está se deteriorando. A lucidez tá indo embora.

Briga, pede, chora, reclama, argumenta. Vamos pra casa.

Operação de guerra. Ambulância. Leito hospitalar. Cuidadora. Fraldas descartáveis. Remédios. Camisolas. Cadeira higiênica. Alimentação pastosa. Perda de tonicidade muscular, queda plantar, ainda delirando à noite.

Fisoterapia. Reabilitação. Aprender a virar-se na cama. Aprender a sentar, a ficar de pé, a segurar o copo, a controlar os esfícteres. Cadeira de rodas, andador, muleta, bengala. Comer sozinha, comida sólida, comprimidos sem ser macerados. Servir seu próprio prato, dar uma voltinha na casa, subir dois degraus. Tudo era motivo de festa, aplausos, uhus, lágrimas, sorrisos.

Um ano difícil, mas que passou. E rápido. Vitórias pequenas comemoradas como grandes conquistas. Grandes conquistas celebradas como uma grande vitória. Um ano de redefinição de paradigmas. O que importa? Quem importa? Quem se importa? Qual é a próxima meta? Viver um dia de cada vez, valorizar as pequenas coisas, agradecer, agradecer, agradecer.

Obrigada à Vida, por existir. Obrigada aos meus amigos, por estarem sempre lá, na alegria e na tristeza. Obrigada ao meu trabalho, por me proporcionar a tranquilidade material tão necessária. Obrigada pela oportunidade de aprendizado, por ter me tornado uma pessoa melhor, por ter salvo a minha Mãezinha.

Amém.

 

 

 

 

Aos Homens

In humor on 11/12/2015 at 11:54 AM

Querido Brógui,

Após centenas de milhares de furiosas mensagens eletrônicas, vindas de cabras-macho, indignados porque só falo bem do sexo frágil, decidi homenagear os homens. Mas só aqueles que, independentemente de sua orientação sexual, merecem o H maiúsculo.

Antes de mais nada, que fique claro que não me arvoro de porta-voz de todas as mulheres do mundo. Sou porta-voz de mim mesma – e olhe lá. Então, meninas, ousem discordar, mas carinhosamente, como damas de fino trato.

Fique claro também que falo baseada em experiências empíricas, comprovadas em laboratório, com um grupo de controle, com cobaias que não sofreram nenhum tipo de abuso. Todas as conclusões foram tabuladas e documentadas  e estão à disposição para consulta.

Por último, antes que fiquem me chamando de sexista, feminista, machista e outros istas, vamos combinar que não dá pra fugir do óbvio e dizer que homens e mulheres são iguais. Não são. Têm os mesmos direitos e obrigações, mas são diferentes. Seja biológica ou culturalmente, seja por aprendizado ou atávico ou inato, somos diferentes. E isso é sensacional.

Ok. Vamos ao que interessa: o que mais se destaca no comportamento masculino? O raciocínio cartesiano, prático, linear, sem subtexto, sem metáforas. Isso é isso. Aquilo é aquilo. Quando diz, não quer dizer, disse mesmo. E se não disse é porque não tem nada pra dizer, não tá querendo que você adivinhe. Não fique tentando analisar, ouvindo a conversa na sua cabeça e procurando captar uma mensagem subliminar que não existe. Não fique passando o filme frame by frame e procurando um sinal oculto na linguagem corporal. Isso é coisa de mulher, homem é fácil de ler e entender, basta ter concluído o Ensino Fundamental da Vida. Nós somos muito mais complexas e o sofrimento deles para nos entender é infinitamente maior.

Esta peculiar forma de ver e encarar o mundo é digna de aplausos. Admiro e tento, na medida permitida pelos meus hormônios, adestrar minha mente para funcionar assim. Em momentos específicos, é altamente funcional. Com esta forma simples e gluten free de pensar, elimina-se as curvas e traça-se uma reta. É rápido, prático, não-emocional, sem grandes abstrações e, acima de tudo, eficaz.

Outra característica digna de ser mencionada é aquele jeito protetor, às vezes até atencioso e delicado. Tipo abrir uma tampa de rosca, ficar à direita na calçada, dar a mão pra atravessar a rua, dizer “deixa que eu resolvo” – esta é a parte que mais gosto. Os homens, quando se deparam com uma mulher que dá conta de tudo, esquecem que nem sempre a gente quer dar conta de tudo. Por vezes eu não quero dar conta de nada. Nem escolher a comida no cardápio.

É bacana, fofo mesmo (não, fofo não, homem odeia ser chamado de fofo) quando ele assume o controle da situação que já estava sob controle e fica todo feliz com isso. É muito legal quando ele coloca o refrigerante no seu copo. Carrega a sua bolsa. Fica em pé pra você sentar. Pequenos gestos que transmitem segurança. Como é bom ter alguém pra segurar sua mão na hora de subir uma escada usando salto alto! Ou que procura um canto pra você conseguir respirar no lugar mais cheio do planeta. E fica ali, demarcando o território.

Devemos permitir, noves fora toda a modernidade, emancipação, independência, blábláblá, que os homens exerçam as atividades nominadas como “coisas de homem”. É fundamental para eles afirmar sua masculinidade, saber que estão cuidando da mulher, que ela precisa dele pra alguma coisa, provar sua virilidade como nos tempos cavernas. A gente não precisa ficar explicando como historicamente aconteceu a divisão social do trabalho, é apenas deixar que o Y seja Y. 

Há algumas outras coisitas do meu estudo que compartilharei com você em outra oportunidade. Agora não dá, já falei demais e o meu público masculino não tem o menor saco pra isso.

Tempo pra nós

In humor on 09/12/2015 at 11:03 AM

Querido Brógui,

Assunto matinal, antes de entrar no prédio. Quanto tempo gastamos ganhando o leitinho das crianças? Quanto tempo nos resta pra fazer nada? Ou tudo? Ou quase tudo (porque nunca dá tempo mesmo)?

Nossa vida é uma eterna correria e a tendência é piorar. Sempre. Ao final do dia, estamos com aquela sensação de que acabamos de sair de uma máquina de fazer massa de pizza – amarrotadas e disformes. Sim: amassadas e disformes, mas sempre apetitosas e prontas para o combate.

Pois é. Mulher que é mulher não perde o glamour nem quando faz hortifruti depois de nove horas de trabalho e duas de academia. Não desce do salto nem trocando fralda de criança. A maquiagem não derrete enquanto briga com o flanelinha. (tudo metáfora, queridobrogui)

Mulher de verdade é macha pra caramba. Encara o nine-to-five e ainda se diverte. Marca consulta no médico enquanto responde a uma mensagem eletrônica. Não dá mole pra homem folgado, enquadra todo mundo.

Mulher bacana, de qualidade, top de linha, é macha sem perder a ternura. Tá falando palavrão e colocando no colo ao mesmo tempo. Perde a paciência, mas não perde a sensatez. Tem um útero do tamanho do mundo, onde acolhe a família, os amigos, os namorados (e congêneres).

Mulher que merece ser chamada de mulher tá sempre ocupada e sempre disponível. Tá sempre pronta para qualquer parada. Já nasceu pronta.

Mulher, em nome da vaidade, do amor a si e ao próximo (ou próxima), no meio de um engarrafamento infernal planeja o cabeleireiro – o cabelo tá sempre precisando de um trato. Pensa em como organizar a logística da depilação plus unhas. Faz esfoliação para ficar com pele de pêssego. Modela sobrancelhas, faz limpeza de pele. Hidrata. Tudo. Da ponta do pé ao cocoruto da cabeça. Passa um perfuminho. Faz uma maquiagenzinha leve pra disfarçar as imperfeições e melhorar as perfeições.

E cadê o tempo? Eu e Mariana concluímos, com todo o brilhantismo, que precisamos propor uma revisão na nossa carga horária de trabalho. Precisamos reduzir nossa jornada pra poder, calmamente, cuidar da nossa beleza, papear com as amigas, andar pela rua sem trotar. Precisamos de algumas horas sem olhar para as horas. Precisamos sentir que o tempo nos pertence, e não o contrário. Precisamos dormir sem culpa. Olhar a vida sem estar procurando alguma coisa.

Urgente também é a revisão dos auxílios, abonos, gratificações e vales. Precisamos de ajuda de custo pra bancar a boniteza. O investimento é alto. Se botar na ponta do lápis, é uma pequena fortuna mensal que se gasta só com a manutenção do equipamento. Se quiser renovar, dar um upgrade, aí fica mais caro ainda.

Daí, vem o cabra e diz que a gente gasta dinheiro com bobagem. Ok. Vai encarar uma ogra? Vai desfilar com a filha do Belzebu? Acho que não. Vai dizer que nem repara? Que o que vale é a beleza interior? Ahã… Vai parar de comparar com a mulher do vizinho que está sempre em dia? Então tá. Ainda assim, eu vou continuar me cuidando. E ponto final.

Fazendo rabanadas

In humor on 27/11/2015 at 10:11 AM

Querido Brógui,

Para desestressar, ao invés de ir à academia, fui pra casa fazer rabanadas. Tá, eu sei que ainda não é Natal, mas tá quase. Além do mais, quem foi que disse que tem dia certo pra comer o que quer que seja?

Aprendi a fazer rabanadas com minha Mamãezinha e agora, de ajudante, passei a ajudada. Se dá muito trabalho? Não. Faz uma lambança desgraçada, mas não dá trabalho, até porque minha versão da rabanada materna é simplificada: misturo os ovos com o leite, taco o pão dentro e fim de conversa. E fica bom?

Ora, ora, queridobrogui, então não sabes tu que minhas rabanadas são conhecidas internacionalmente? Por que? Porque minha adaptação inclui substituir parte do leite de vaca por leite condensado. Nooooossa! Então engorda horrores! Claro que sim. Quer emagrecer? Coma alface e não rabanada.  Mas, se quiseres ficar com a consciência menos pesada, use leite de vaca desnatado. Para dar o toque final, elas são fritas na manteiga. Ficam sequinhas, com aquele sabor salgadinho lá no fundo quebrando o enjoado do leite condensado. Finalize com açúcar e canela. Vais comer rabanada até passar mal.

Enquanto fazia a preparação inicial, que inclui descascar o pão, fiquei papeando com minha Mãezinha.  É impressionante como, na correria da vida, às vezes ficamos dias conversando telegraficamente com a pessoa que mora debaixo do mesmo teto. A noite de ontem eu dediquei a dar a ela atenção merecida.

Durante a processo, fui lembrando de algumas coisas e algumas pessoas. Lembrei de uma amiga que adorava rabanadas e me disse ano passado que nunca mais havia comido uma desde que mãe dela morrera. Bem, a essa altura, se no Céu há rabanadas, ela deve estar saboreando algumas feitas pela sua mãe.

Mamãe lembrou que minha tia fazia rabanadas pelo Natal, num fogareiro à lenha. Ela sentava em um banquinho e tome rabanadas!  Meu avô cuidava de manter o fogareiro aceso, com fogo bem alto. É, queridobrogui, tem que ser em fogo alto, senão a rabanada fica empapada de gordura.

Rabanada vai, rabanada vem, nós duas conversamos, cantamos, comemos algumas quentinhas saindo da frigideira e, ao final, estávamos felizes. Ok, a cozinha estava em petição de miséria: louça até o teto, o fogão todo lambrecado de açúcar, leite e manteiga. E daí?

Como se defender de uma granada

In humor on 26/11/2015 at 2:10 PM

Querido Brógui,

Na falta de do que falar, vamos falar bobagens. Para escolher o tema, entrei num site que me chamou atenção porque recebi uma mensagem que dizia que comer em prato azul com talher azul, de preferência num ambiente azul, fazia emagrecer. Neste site, dentre as milhares de informações, esquisitas, inúteis, mas definitivamente interessantes, uma despertou o queridobrogui: o que você deve fazer se lançarem uma granada em sua direção?

Bem, a menos que tente aproveitar as promoções de aniversário de algum supermercado, dificilmente passará por uma situação desta. De todo modo, acho legal estar sempre preparado para qualquer emergência.

A primeira recomendação é não correr, o que eu acho difícil de lembrar na hora. É claro que, se estiver distraído olhando o preço do filé mignon pra ver se dessa vez você consegue comprar, a granada vai vir voando e você nem vai precisar lembrar desta recomendação. Se estiver atento, ligado na missão de evitar que alguém fure a fila do balcão de frios, vai ver a granada vindo, mas também não vai correr porque o próximo da fila é você e afinal de contas há duas horas está ali esperando pra pegar a muçarela da pizza do lanche. De todo jeito, dependendo da quantidade de pessoas por centímetro quadrado, não vai dar pra correr mesmo.

A segunda recomendação é não tentar jogar a granada de volta pro inimigo. Essa é fácil de atender, a não ser que você seja fã de filmes de ação, no qual o mocinho faz isso no meio de um tiroteio comendo um hambúrguer com a outra mão. Daí, num ato reflexo, você esquece que a granada do filme é de mentirinha e parte pro contra-ataque. Caso isto aconteça, lembre-se de que você tem 4 segundos para executar a manobra antes que a granada exploda na sua mão.

O mais recomendado é se jogar no chão. Ao seguir esta recomendação, tenha em mente que, em hipótese alguma, você deve se jogar em cima da granada. Você não é o Robocop, nem um Transformer, nem o Exterminador do Futuro. Você vai se machucar. Feio. Lembre-se também de que o estilhaço de uma granada pode alcançar até 10 metros, logo, seu salto tem que ser de, no mínimo, 11 metros na direção oposta ao local onde ela caiu. Demanda um pequeno e rápido cálculo envolvendo a distância entre você e a granada, o seu peso corporal e a velocidade do vento, mas dá certo.

A outra opção é se esconder atrás de algum obstáculo. No caso do supermercado, não opte pelas gôndolas de bebidas. Você escapa da granada, mas será retalhado pelos cacos de vidro. Também não é legal a sessão de pescados. Nunca mais você vai conseguir tirar a catinga de peixe do seu corpo.

Na boa? Eu aconselharia algo muito mais eficaz para evitar as consequências de uma granada lançada na sua direção: não vá ao supermercado em dia de promoção.

PS: a questão do efeito emagrecedor do prato azul com talher azul e o ambiente azul é que não existem alimentos azuis, daí seu cérebro não se identifica com a comida e você come menos. Ora, ora… Então não é o prato azul com talher azul e o ambiente azul que vão lhe emagrecer, e sim comer menos.

Programa Cachorro

In humor on 25/11/2015 at 10:45 AM

Querido Brógui,

Programa cachorro também pode ser divertido. Programa cachorro? É. Tipo festa infantil com aquela barulheira infernal, crianças enlouquecidas correndo suadas e descalças por todo o lado, animador gritando no microfone (um dos mistérios indecifráveis da humanidade é por que as pessoas gritam ao microfone. o treco não é pra ampliar o volume da voz? pra quê ficar berrando?) e, invariavelmente um calor insuportável. Bem, se ao menos a comidinha estiver a contento, a chatice pode ser suportada e a vontade de cortar os pulsos controlada.

Como tudo é relativo, o conceito de programa cachorro também varia de pessoa pra pessoa (tem gente que se amarra em acordar cinco horas da manhã pra ir correr debaixo de chuva), varia conforme a época da sua vida (houve um tempo em que eu viajava sem antes investigar a condição de salubridade do local de destino), varia conforme as condições atmosféricas (fila de restaurante, só com os hormônios em dia, com a Lua em Sagitário e se eu estiver em estado de inanição).

A única invariável é que, se a companhia for boa, qualquer programa cachorro vira um programasso, com direito a boas gargalhadas. Bem acompanhado, a gente ri até de fratura exposta.

Ontem, a diversão foi garantida pela companhia de minha comadre, fiel escudeira nas cachorrices da vida. Muito constrangida, fiz a proposta indecente, o convite quase imoral e ela aceitou toda animada. Saí do trabalho, de salto alto, com os dedões do pé prestes a gangrenar, rumo à paradisíaca loja de materiais de construção (que, diga-se de passagem, minha comadre disse adorar. ok, é só dar o remedinho na hora certa e não contrariar.)

Nada como aquele cheirinho de poeira a obstruir suas vias aéreas! Nada como a vista inebriante de pisos e revestimentos, louças e metais! Que felicidade ter que ficar acocorada escolhendo uma ducha higiênica! Isso sem contar o banho de cultura. A sutil diferença entre argamassa e rejunte. A necessidade de um anel de vedação para o vaso sanitário. A existência de uma coisa chamada coluna para lavatório. Tanta coisa interessante, que não sei como sobrevivi tantos anos sem este precioso conhecimento.

O vendedor, corria pra lá e pra cá nos atendendo (e a outros clientes), tentando dar conta de tirar nossas dúvidas, procurar o que queríamos, filtrar nossas conversas paralelas, esperar eu tirar fotos e falar ao telefone. Na hora de fechar a conta, puxei meu lencinho e banhei a mesa do pobre com minhas lágrimas. Ganhei um desconto que deu pra cobrir o frete. Quem não chora,

Na boa? Foi divertidíssimo! Entre uma torneira e outra, fazendo as contas pra economizar mas também não comprar nada muito ordinário, nós rimos, choramos, falamos mal dos homens (sempre, não dá pra evitar), trocamos ideias sobre o futuro da humanidade, rimos mais, tomamos um suquinho de lata, nos abraçamos, fizemos revelações altamente confidenciais daquelas que nem às paredes e, ao final, alma lavada e enxaguada, conseguimos montar um banheiro inteiro.

Horas depois, fim do passeio. Fomos as últimas a sair da loja, com a sensação de menos-um-problema-pra-resolver. Conseguimos, na maior parte do tempo, tirar o foco daquilo que nos incomoda e relaxar um pouco.

Programa cachorro pode ser divertido. Terapêutico. Catalizador de boas energias. E tenho dito.

Rebeldia construtiva

In humor on 24/11/2015 at 10:20 AM

Querido Brógui,

O mundo está muito esquisito. Mesmo. Tanta coisa ruim acontecendo, pessoas matando pessoas, pessoas matando a natureza, pessoas levando o sofrimento para outras pessoas. Isso tudo me leva de um extremo ao outro. Ou vários extremos, eu diria. Passo da tristeza à apatia, sigo para à euforia, parto para a raiva, caio na hiperatividade e finalizo na falta de vontade de escrever, que é o meu termômetro de felicidade.

Não tenho me permitido ficar bem, nem aproveitar de verdade o breve e fugaz brinde de estar viva. Tomo o sofrimento alheio como o meu próprio, uma empatia às vezes absurda, que até tem seu fundo filosófico nas palavras de Dalai Lama – enquanto houver um ser em sofrimento, todos estaremos em sofrimento. Só que eu exagero e esqueço que o próprio Dalai Lama recomenda que sejamos felizes.

Hoje eu decidi me opor a mim mesma e a essa palhaçada de ficar me martirizando pelo simples fato de que a minha vida – ainda que com atropelos, tombos, mancadas e trombadas – é boa. Decidi que não vou me sugar pra dentro de um buraco só porque o mundo está indo, inevitavelmente, pra dentro dele. Que minha resistência ao Mal será ficar cada vez mais alegre, positiva, esperançosa. Que vou redimensionar minhas prioridades e desprezar o que é desprezível (parece redundante, e é mesmo).

Vou começar novamente a rir de mim e de meus desastres – como o galo que fiz ao dar uma cabeçada na janela porque fui olhar pra fora e esqueci que ela estava fechada.

Vou recomeçar a rir do que não tem a menor graça, mas que exatamente pelo bizarro é que é engraçado – como o ladrão que na maior cara de pau bateu no vidro do meu carro e pediu pra eu abrir porque ele queria me tomar o celular.

Vou cair da cadeira rindo quando no trabalho me pedirem alguma coisa absurda como se fosse a coisa mais normal do mundo – tipo dar a  mesma informação pela milionésima vez.

Tratarei como surreal que é que, num mundo em crise, ainda haja alguém que defende a violência como solução, que continue cultivando burros preconceitos (outra redundância), que não consiga ver que atitudes individuais comprometem o coletivo.

Minha rebeldia não será destrutiva. Demonstrarei minha rebeldia resistindo à infelicidade, à amargura, rindo pra caralho, falando bobagem, dando beijo na boca, enchendo a porra do saco dos outros, ouvindo música no trabalho e dançando sentada na cadeira, lendo e, principalmente, escrevendo pra você. Vou liberar o Querido Brógui da quarentena.

Sejamos felizes juntos.

 

 

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