Fatinha

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Eu, Mr Hyde e Hulk

In humor on 26/08/2014 at 1:50 PM

Querido Brógui,

Após longo e tenebroso inverno, cá estou eu de volta.

Tenho andado mergulhada em mim mesma e nos livros. Buscando. Ou tentando parar de buscar. Quando mergulho em mim, vejo que sou um poço sem fundo, não consigo mesmo identificar quem sou eu, parece que sou muitas em uma só e isto me confunde um pouco. Até li de novo Dr. Jekyll and Mr. Hyde para, mais uma vez, constatar que dentro de cada um de nós habita um ser que reprimimos por achá-lo grotesco, mas que ao mesmo tempo torcemos para que se liberte – ao menos de vez em quando.

Vivemos tentando separar bem direitinho o que é o “bem” e o que é o “mal”, numa visão maniqueísta que prega a existência de indivíduos totalmente legais ou totalmente filhosdaputa. Ok. Há pessoas 100% legais – raridade – e pessoas 100% filhasdaputa – não tão raras assim. De todo modo, se tirarmos a máscara – sozinhos, dentro do banheiro, com a luz apagada -, será forçoso reconhecer que não somos tão bacanas assim e que, mesmo em pensamento, derrapamos na barbárie vez por outra e que talvez sejamos capazes de fazer coisas horríveis que há cinco minutos atrás condenamos no vizinho.

A literatura, bem como alguns filmes, nos apresenta personagens que se assemelham nesta busca de ser uma criatura perfeitamente enquadrada dentro de regras sociais – absolutamente necessárias – e o quanto estas regras nos aprisionam. Dr. Jekyll, por exemplo, careta até o último fio de cabelo, vivendo em uma sociedade e em um tempo repleto de tabus, doido pra meter o pé na jaca. Dr. Jekyll descobre que há dentro dele um Mr. Hyde fascinante exatamente porque ele não está nem aí para este tipo de convenção e representa a busca da liberdade sem limites, o egoísta amor só por si mesmo, o delito que não conhece remorso, a falta de inibição, barreiras, censuras. E o Doutor, ao mesmo tempo que briga com si mesmo porque o monstro que habita dentro de si é violento e amoral, gosta cada vez mais da sensação de não ser ele mesmo.

E o Hulk? O chatíssimo Doutor David Banner pira quando fica com raiva, exatamente como todos nós gostaríamos de fazer – sem passar pelo ridículo de rasgar todas as roupas, menos as calças, coisa que nunca, nem quando eu era criança vendo aquele enlatado dublado, consegui engolir. Nós, animais domesticados, aprendemos a nos controlar, a canalizar nossa agressividade fazendo patchwork ou socando um saco de areia ou correndo 25 kilômetros ladeira acima ou meditando, ou seja lá o que for que fazemos para sufocar a vontade de matar alguém de porrada. Nem sempre conseguimos evitar a fúria, mas, a maioria de nós consegue resolver as questões sem partir para as vias de fato. O máximo que nos permitimos é dizer uns desaforos, uns palavrões e pronto.

Onde eu quero chegar com isso? A lugar nenhum. Só uma reflexão e um propósito de parar de brigar comigo mesma quando cometo todos os sete pecados capitais – gula, avareza, luxúria, ganância, inveja, preguiça e orgulho. Parar de me cobrar uma perfeição que não existe, de me sentir a última das criaturas quando fico com raiva, quando sou cruel, quando penso (e falo) mal dos outros.

Sobre os livros? Fica para o próximo.

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