Querido Brógui,
Algumas coisas parecem simples, são simples, mas não são tão simples assim. Entende? Vou explicar: quantas células cinzentas são necessárias para colocar quarenta garrafões de água dentro de um caminhão? Uma, talvez duas, mas não mais que três, você me responderá, sem titubear. Errado. Hoje eu vi, com esses olhinhos que a terra não há de comer tão cedo, que não é bem assim.
Tudo começou com o abastecimento de água mineral da comarca de Nova Iguaçu, que contempla Seropédica, Japeri, Paracambi, Queimados e adjacências. Bem que dizem que no inferno não tem água. (Desculpe aí, Ana Lúcia. Já disse que perco o amigo, mas não perco a piada.). Responsável que sou pela hidratação e sobrevivência dos nobres colegas que labutam naquela região, iniciei ontem um processo kármico para dar água aos que têm sede. Finalmente consegui reunir, após de andar – de salto alto – por todo o maldito prédio, os malditos garrafões com a maldita água mineral – isso porque a maldita empresa fornecedora não cumpriu o maldito prazo de entrega.
Agendei o transporte, convoquei a Tropa de Elite para ajudar na tarefa e hoje, às dez para as dez da manhã, estava eu no estacionamento – de salto alto – para acompanhar o desenrolar da situação. Ou seria o enrolar da situação? Às dez, chegou o primeiro rapaz empurrando o carrinho com dois garrafões. Fiz as contas (mentalmente, mas não rapidamente) e o resultado foi que, nesse ritmo, ele precisaria dar apenas vinte viagens do segundo subsolo ao térreo para completar a missão. Respirei fundo e esperei impaciente por vinte minutos. O rapaz desceu para as profundezas do prédio e não apareceu mais – provavelmente abduzido pelos homens-toupeira.
Desci atrás dele para o resgate, pois, afinal, vinte viagens, multiplicadas por vinte minutos cada uma, ele iria demorar quatrocentos minutos para acabar o serviço. Com sorte, lá para as três horas da tarde eu me livraria do karma. Os agentes da Tropa de Elite também se demonstravam inquietos. Chama pelo rádio, celular, sinal de fumaça, tambor, desce todo mundo, chama a supervisora, chama o encarregado, chama mais rapazes, pega mais carrinhos, Dona Fátima tá aqui com o cronômetro ligado!
Subi de novo e me posicionei – de salto alto – ao lado do caminhão. Apareceu outro rapaz empurrando o carrinho com mais três garrafões – menos mal, meu tempo de espera seria reduzido para duzentos e sessenta minutos. Parou o carrinho, tirou o primeiro garrafão e o encostou na parede. Amigo, será que não seria melhor tirar o garrafão direto do carrinho para o caminhão? Desculpe, não quero me meter no seu trabalho, mas eu acho que você ficaria menos cansado… Ele me olhou e começou a carregar o garrafão para o caminhão. Será que não seria mais fácil aproximar o carrinho do caminhão? Ele bufou e fez o que eu sugeri. Agradeci com o meu melhor sorriso.
Ok, depois de uma mobilização de sete pessoas, caminhão carregado rumo à Nova Iguaçu. Fiz uma prece e benzi o caminhão e sua carga. O pessoal do CRAAI Nova Iguaçu já deve estar bebendo a água benta. Amém.